quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

O HOMEM QUE VIROU SUCO

O Comitê de Cinema da UFOP (ComCine), a Pró-Reitoria de Extensão da UFOP (ProEx), o Instituto de Filosofia, Artes e Cultura (IFAC/UFOP) e o Cine-Teatro Vila Rica apresentam o último filme do Cineclube ComCine deste ano. Todas as sessões são gratuitas, com filmes da Programadora Brasil – Central de Acesso ao Cinema Brasileiro.




Nesta semana:


Histórias populares do Nordeste estão neste programa composto de dois filmes realizados na mesma época. São as histórias transmitidas oralmente que eventualmente se transformam em literatura de cordel e em canções. A animação pernambucana A saga da Asa Branca ilustra, em estilo de cordel, a célebre toada Asa Branca, de Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga, gravada pelo rei do baião pela primeira vez em 1947. Também em estilo de cordel, O homem que virou suco é um dos filmes mais contundentes e fascinantes sobre o tema da migração nordestina para São Paulo. Nele, o ator José Dumont desempenha duplo papel, de dois migrantes em que um assassino e um cantador são confundidos. Diversão e reflexão.


:: A SAGA DA ASA BRANCA

De Lula Gonzaga

(RJ, 1979, animação, cor, 7 minutos)


[CURTA] Asa Branca é um pássaro de arribação que voa do sertão quando percebe que a seca vai chegar. O filme é um "semi-documentário" em desenho animado, que retrata o pássaro e o sertanejo com sua mulher (Bernardino e Rosinha), partindo da sua terra com a chegada da estiagem. Com texto e narração de Humberto Teixeira, compositor da música Asa Branca, foi este o único trabalho de Humberto no cinema e também seu último trabalho. Na trilha sonora, o arranjo sinfônico do maestro Guerra Peixe.
:: O HOMEM QUE VIROU SUCO

De João Batista de Andrade

(SP, 1979, ficção, cor, 97 minutos)


[LONGA] A história segue Deraldo, um poeta popular nordestino recém chegado a São Paulo, onde tenta sobreviver de sua poesia e folhetos. Confundido com o operário de uma multinacional que mata o patrão, é perseguido pela polícia e perde sua identidade e condição de cidadão. Através de Deraldo, o filme acompanha o caminho do trabalhador migrante numa cidade grande: a construção civil, os serviços domésticos e subempregos sujeitos à violência e à humilhação. E segue a luta de Deraldo para reconquistar sua liberdade e preservar sua identidade.



Data: Sexta, 05 de dezembro

Local: Cine-Teatro Vila Rica

Hora: 23:00


ENTRADA FRANCA





CLÁSSICO E POPULAR

Por Carlos Alberto Mattos



O Homem que virou suco é exemplo típico - e um dos melhores - de um conjunto de operações que o cinema brasileiro fazia na segunda metade da década de 1970 para estabelecer um diálogo melhor com o público, sem trair as conquistas estéticas do Cinema Novo e do Cinema Marginal.


Para começar, o filme reelabora padrões da narrativa clássica com ingredientes de um cinema popular. Basicamente, é a história do duplo (expressionismo alemão) e do homem errado (policial estadunidense) que se desenrola entre Severino e Deraldo, os dois sósias nordestinos envolvidos num equívoco criminal. O tema igualmente clássico do imigrante é tratado desde o título, e em toda sua extensão, como material de literatura de cordel. Assim o diretor procura fundir seu filme com formas de representação características do povo nordestino.


Naquele período, o cinema brasileiro também experimentava uma crescente simbiose entre práticas do documentário e da ficção, num movimento iniciado por Iracema - Uma transa amazônica, em 1974, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna. Daí a importância da improvisação nos diálogos, de uma relação especialmente livre entre câmera e atores e até de uma certa submissão da técnica às condições do local de filmagem.


Por fim, vemos um diretor que não abre mão de seu passado. É nas seqüências de rua que João Batista de Andrade semeia os ecos de sua militância no cinema marginal paulista anos antes, quando era comum promover-se performances em praça pública para que o filme absorvesse o inesperado da participação popular.


Esta denúncia do esmagamento dos deraldos e severinos, seja pela marginalização, seja pela inserção aviltante, conta com a sensibilidade do diretor para criar uma poética em meio ao drama e à comédia. As cenas da batida policial noturna e da leitura da carta no alojamento dos operários são reveladoras de um olhar humanista que transcende toda urgência e objetividade.


A presença de José Dumont, no filme que o revelou plenamente, extrapola a mera questão cênica. No fundo, é o próprio ator que está na pele de Deraldo, ele que também chegou da Paraíba sem documentos e soube se impor pelas artes do talento. Coisa semelhante se passou com o próprio filme, lançado em 1980 sem maior repercussão e “redescoberto” pelos brasileiros depois de vencer ex-aequo o Festival de Moscou. O suco, portanto, só veio depois da vodka.


O curta que complementa este programa reverbera o tema da imigração a partir de outro ícone da cultura nordestina: a canção Asa Branca, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Uma animação naïf, mas expressiva, reitera o drama da fuga para um sonho impossível.

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