quarta-feira, 12 de novembro de 2008

BANG BANG / BLÁ BLÁ BLÁ

O Comitê de Cinema da UFOP (ComCine), a Pró-Reitoria de Extensão da UFOP (ProEx), o Instituto de Filosofia, Artes e Cultura (IFAC/UFOP) e o Cine-Teatro Vila Rica apresentam a programação do Cineclube ComCine do final deste ano. Todas as sessões são gratuitas, com filmes da Programadora Brasil – Central de Acesso ao Cinema Brasileiro.


Nesta semana:


O cinema de Andrea Tonacci é único e sem paralelos dentro do cinema brasileiro. Por mais que se costume localizar seus filmes no cerne do chamado Cinema Marginal, de fato seus trabalhos se diferenciam bastante do que se realizou em torno daquele movimento cinematográfico. Marcado por uma preocupação rigorosa com a linguagem do cinema em seus elementos constitutivos básicos (fotografia, som e, principalmente, a montagem), seu cinema ainda assim revela-se muito pouco formalista e, ao mesmo tempo, extremamente humano e urgente. Com Bang bang e Bla bla bla..., Tonacci nos impõe um paradoxo de enorme beleza: faz um cinema radicalmente atemporal, mas ao mesmo tempo profundamente fincado no momento histórico em que é realizado. Trata-se de uma dupla de filmes essencial para compreender o Brasil da virada dos anos 1960 para os 1970, mas também de hoje e sempre.




:: blá blá blá...


De Andrea Tonacci


(RJ, 1968, fic, pb, 26 minutos)

[CURTA] O sentido do poder e da palavra em crise situam o homem que os manipula numa idêntica crise pessoal, humana. A farsa do discurso de intenção humanista é total e absoluta. Um ditador num momento de uma grave crise nacional, institucional, confrontado na cidade e no campo por revoltas e guerrilha, na busca de uma paz ilusória, faz um longo pronunciamento pela televisão. Mas a realidade impõe-se à sua ficção e o controle da situação escapa-lhe das mãos. Sobra-lhe uma patética confissão antes de ser tirado do ar.







:: BANG BANG


De Andrea Tonacci


(SP, 1970, fic, pb, 85 minutos)

[LONGA] O ator de um filme em realização vive sem distinção a sua realidade pessoal e a ficção de seu personagem. Busca um sentido e uma saída daquela situação enquanto é perseguido por bandidos, um mágico, uma fantasia amorosa, um bêbado, sua auto-imagem.... A comicidade, os motivos da perseguição, as situações, os personagens, a cenografia, os diálogos e a trilha sonora, que utiliza temas conhecidos de outros filmes, remetem a símbolos, metáforas e à recusa da possível lógica narrativa, permitindo ao espectador uma sensação análoga à do personagem central. Uma viagem bem humorada e visualmente moderna.





Data: Sexta, 14 de novembro

Local: Cine-Teatro Vila Rica
Hora: 23:00



ENTRADA FRANCA










INVENÇÃO SEM LIMITES


Por Marcus Mello

Poucos filmes brasileiros são alvo de um culto tão apaixonado entre os cinéfilos como Bang bang, de Andrea Tonacci. Uma obra concebida sob o signo da irreverência e da liberdade, Bang bang forma, ao lado de O Bandido da luz vermelha (1968), de Rogério Sganzerla, e O pornógrafo (1970), de João Callegaro, a grande tríade metalingüística do cinema paulista produzida na virada dos anos 1960 para os 1970, fortemente inspirada pela obra de Jean-Luc Godard. Era o cinema moderno realizando-se em sua plenitude no Brasil, no auge da ditadura militar.

Nascido na Itália e radicado em São Paulo desde 1953, Andrea Tonacci implode a narrativa clássica em Bang bang, construindo seu filme através de longos planos-seqüência, que encantam pelo insólito das situações, pelo humor e pelo rigor da construção. A trama, ou fiapo de trama, acompanha um homem (Paulo César Pereio) perseguido por três bandidos (um deles travestido) pelas ruas de Belo Horizonte. A influência de Godard manifesta-se de todas as formas em Bang bang, seja pela citação direta ou pela incorporação de elementos estilísticos caros ao diretor franco-suíço, como a preferência pelos travellings ou o uso da metalinguagem. O filme apresenta uma série de seqüências fechadas em si próprias, sem ligação aparente com o que vem a seguir e freqüentemente repetidas com leves alterações, à maneira de variações musicais. O uso recorrente da canção Eu sonhei que tu estavas tão linda, cantada pelos personagens em diferentes momentos da narrativa, acentua esse caráter de composição musical identificado na arquitetura de Bang bang.



Filme de cinema, em que a presença da câmera várias vezes é revelada ao espectador, seja através do reflexo em um espelho ou de um personagem chocando-se contra a lente, Bang bang é um tiro mortal no coração dos acomodados e sem imaginação. Sua invenção não tem limites, provocando momentos da mais alta diversão, dignos de um filme de aventura como Hatari (1959), de Howard Hawks, citado de forma explícita numa das tantas cenas antológicas deste clássico da transgressão.



Bla bla bla... é um notável exemplar do cinema político brasileiro. Esse média-metragem realizado por Andrea Tonacci em 1968 contrapõe imagens de arquivo e seqüências encenadas de um grupo de guerrilheiros em ação ao discurso de um político (Paulo Gracindo) diante das câmeras de televisão. A afirmação de Maiakóvski de que não existe arte revolucionária se a forma não for revolucionária aplica-se com perfeição a Bla bla bla..., um pequeno grande filme que, a seu tempo, anunciou os anos de chumbo a serem enfrentados pelo Brasil depois do AI-5, mas consegue ainda hoje permanecer assustadoramente atual.





Próximos filmes do Cineclube ComCine em 2008:



sex 21/11 – Tudo Bem (de Arnaldo Jabor)



sex 28/11 – A Lira do Delírio (de Walter Lima Jr.)



sex 05/12 – O Homem que Virou Suco (de João Batista de Andrade) e A Saga da Asa Branca (curta de Lula Gonzaga)

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