terça-feira, 30 de setembro de 2008

DURVAL DISCOS / A ORIGEM DOS BEBÊS SEGUNDO KIKI CAVALCANTE

O Comitê de Cinema da UFOP (ComCine), a Pró-Reitoria de Extensão da UFOP (ProEx), o Instituto de Filosofia, Artes e Cultura (IFAC/UFOP) e o Cine-Teatro Vila Rica apresentam a programação do Cineclube ComCine deste segundo semestre de 2008. Todas as sessões são gratuitas, com filmes da Programadora Brasil – Central de Acesso ao Cinema Brasileiro.

No mês de outubro, o Cineclube ComCine exibe em cada sexta-feira um curta-metragem, seguido de um longa.



Nesta semana:

O grande vencedor do Festival de Gramado de 2002 (sete Kikitos, incluindo o de melhor filme), “Durval Discos”, longa-metragem de estréia da diretora Anna Muylaert, alterna elementos de comédia absurda, drama comportamental e suspense. A história do quarentão que teima em vender apenas vinis em sua loja de discos, sua relação com a mãe amalucada e a chegada de uma menina que vai implodir esse universo se vale bem da mistura de gêneros e estilos e das freqüentes mudanças de tom. Também tendo uma menina imaginativa como protagonista, o curta “A origem dos bebês segundo Kiki Cavalcanti”, realizado sete anos antes do longa, já revelava o gosto da cineasta pelo humor insólito e seu talento para a direção de crianças.



:: A ORIGEM DOS BEBÊS SEGUNDO KIKI CAVALCANTE
De Anna Muylaert
(SP, 1996, ficção, cor, 17 minutos)

Comédia de costumes sobre as confusões que as crianças fazem a respeito da vida sexual dos adultos.




:: DURVAL DISCOS
De Anna Muylaert
(SP, 2002, ficção, cor, 93 minutos)


Solteirão, com jeitão de hippie, tem uma loja de discos e ainda mora com a mãe. Com a chegada do CD, recusa-se a vendê-los, mantendo-se fiel ao vinil. O inesperado aparecimento de uma menina mudará para sempre as vidas de Durval e de sua mãe dominadora, mostrando que tudo na vida tem um lado A e um lado B, como nos LPs.




Data: Sexta, 03 de outubro
Local: Cine-Teatro Vila Rica
Hora: 23:00

ENTRADA FRANCA


IMUNIZAÇÃO (IR)RACIONAL
Por Rodrigo de Oliveira


Em “A origem dos bebês segundo Kiki Cavalcanti” somos apresentados a Kiki, uma criança encantadora e sobre a qual é impossível ter qualquer controle. Criada num ambiente atribulado devido às constantes brigas dos pais e à ascendência do irmão endiabrado, Kiki trabalha dentro de si essas influências e ali, em sua cabeça explodindo de conexões cuja lógica é toda particular, temos entrada proibida (ainda que Anna Muylaert sempre insista, e muito bem, no contato com o imaginário infantil – basta olhar seu trabalho na criação de séries como “No mundo da lua”, “Castelo rá-tim-bum” ou “Um menino muito maluquinho”). O que podemos ver são as manifestações do contato de Kiki com o mundo, e sua teoria torta – mas justificada pelas confusões familiares – sobre o nascimento dos bebês. Kiki sustenta um paradoxo fundamental: mantém a visão inocente da infância, mas já está completamente contaminada pelos símbolos da violência.


Sete anos depois, Anna Muylaert retorna à Kiki, e mesmo que seja interpretada por outra atriz-mirim e tenha um sobrenome diferente, a menininha de “Durval Discos” carrega a mesma presença simbólica de antes. É uma questão de confronto de mundos. Primeiro há a vivência estática de Durval e Dona Carmita. O começo do filme nos apresenta esta velha casa paulistana e sua loja de discos como um ambiente analógico que resiste à crescente digitalização ao seu redor. Mas ainda existe o “ao redor”, ainda mantém-se um contato com o lado de fora, para o qual Durval e a mãe são perfeitas antíteses. O rigor formal é absoluto: longos planos de câmera parada, estabelecendo a imutabilidade atroz daquela existência (é a mãe assentada na velhice, o filho velho-garoto preso a ela, os flertes com a vizinha que nunca passarão disso). Kiki, esta força que não se controla, que encerra em si a inocência e a violência, chega para mover a vida – e, eventualmente, mover a câmera. Uma seqüência simples de conversa na sala ganha fluência pela simples presença da menina: um rodopio em torno da mesa, que empurra Durval e Dona Carmita para os cantos e coloca Kiki no centro deste novo universo criado por ela.


Kiki olha para meia dúzia de ratos de esgoto e diz: “Olha, o Mickey!?”. Ela é capaz de assimilar qualquer estranheza e transformá-la em doce loucura. Sua presença isolará definitivamente a casa do mundo exterior (e se houver uma incursão por ele, digamos, pelo trânsito caótico de São Paulo, só se for a bordo de uma charrete).


Num filme musical como este, as canções são mais que preenchimento de fundo. No passeio de bicicleta pela casa, cena que equilibra a candura de Kiki com a memória de um passeio similar, do menino aterrorizado em “O Iluminado”, de Stanley Kubrick, Durval coloca uma música do disco “Racional”, de Tim Maia. A questão parece bem essa: a tentativa de racionalização não esconde a irracionalidade latente em todo o projeto. Kiki é agente dessa lógica distorcida, e nem Durval, nem Dona Carmita, nem mesmo o próprio filme estão imunes a isso.


Passado todo o pequeno épico buñueliano que se arma dentro da casa, Durval toma tempo para ouvir uma última música antes de abrir novamente as janelas para o mundo. E toca “London, London”, na voz de Gal Costa. Se a criança é sempre uma caixa de mistérios, e se contra a loucura de sua mãe não há mais o que fazer a não ser se desesperar, a saída é mesmo o exílio emulado por Caetano. Só assim, talvez, Durval consiga se integrar ao que acontece lá fora. Só assim, talvez, ele consiga se misturar aos signos visuais da cidade, como na seqüência de créditos iniciais em que os nomes dos realizadores aparecem misturados a placas e anúncios de rua. Durval briga, no fundo, pelo direito de fazer parte de loucuras mais saudáveis que aquelas de sua pequena e febril loja de discos. Briga pelo direito de exilar-se no mundo real.








Próximos filmes do Cineclube ComCine – curtas & longas:




sex 10/10 – O Catedrático do Samba / Samba Riachão


sex 17/10 – O Último Raio de Sol / O Rap do Pequeno Príncipe Contra as Almas Sebosas


sex 24/10 – O Sanduíche / Por Trás do Pano


sex 31/10 – Rua do Amendoim / Amor & Cia










O ComCine UFOP


Criado em 2004, o ComCine – Comitê de Cinema da Universidade Federal de Ouro Preto, é um grupo formado por pessoas de diversas áreas da universidade (alunos, professores e funcionários) e também da comunidade externa, reunidos todos pela admiração ao cinema. Seu principal objetivo é servir como fórum de discussão sobre o audiovisual, considerando a sua produção, circulação e recepção. Trabalha levando o melhor do cinema às pessoas, num processo de formação de público e olhar crítico. Em 2006, o Conselho Universitário (CUNI) aprovou seu regimento interno, reconhecendo-o como espaço privilegiado de discussão e deliberação sobre o audiovisual na UFOP.


Entre suas atividades, destacamos a curadoria da área de Artes Visuais (cinema, vídeo, fotografia) do Festival de Inverno de Ouro Preto e Mariana – Fórum das Artes 2007 e 2008, além da elaboração de mostras regulares ao longo do ano, compostas por filmes temáticos e alternativos, em sessões gratuitas e, por vezes, itinerantes, nestas mesmas cidades. O principal evento atual é o "Cineclube ComCine", que acontece todas as sextas-feiras, às 23h, no Cine-Teatro Vila Rica, com entrada franca. E uma vez em cada período letivo da universidade, promove a "Conversando Cinema": a mostra de filmes comentados por professores, às 21h, no Cine-Teatro Vila Rica, com duração de uma semana e entrada gratuita.


As reuniões são abertas a todos os interessados, para, entre uma discussão e outra, planejar mostras gratuitas, sugerir filmes para a programação do Cine-Teatro Vila Rica – o qual faz parte do patrimônio da UFOP – e criar novas idéias para estimular a comunidade a interessar-se por esta que é chamada a Sétima Arte.

3 comentários:

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

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